quarta-feira, 3 de março de 2010

Um estranho no ninho

Resenha: One Flew Over the Cuckoo’s Nest (Um estranho no ninho).
Por: Tanise Lino Cardoso
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A obra cinematográfica do turco Milos Forman induz a reflexão sobre a loucura e o lugar do hospital psiquiátrico, evoluções e involuções no tratamento manicomial desde a década de 70. Consequentemente incita-nos a perguntar, seria a humanização do asilo psiquiátrico realmente possível?
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Gênero: Filme - Drama.
Duração: 02 hs 09 min.
Ano de lançamento: 1975.
Estúdio: Fantasy Films.
Direção: Milos Forman.
Atores principais: Jack Nicholson (Randle Patrick McMurphy), Louise Fletcher (Enfermeira Mildred Ratched), Danny deVito (Martini).

Um estranho no Ninho - Breve alusão a historia da loucura.

Phillipe Pinel, médico francês considerado o pai da psiquiatria, é reconhecido como o pioneiro no processo de humanização do hospital psiquiátrico. Numa sociedade em que as doenças mentais eram encaradas como possessões demoníacas, pelo povo e pelos médicos, Pinel corretamente as considerou como resultado de tensões sociais e psicológicas excessivas, de causa hereditária, ou ainda originada por acidentes físicos e propôs a abolição de tratamentos abusivos como sangria, purgações e vesicatórios, em favor de uma terapia pautada no diálogo e no contato próximo de familiares e profissionais com o paciente, além de atividades lúdicas dirigidas.
O filme protagonizado por Jack Nickolson (McMurphy) é baseado no romance “Um estranho no ninho” de Ken Kesey, uma obra refletora de experiências pessoais vividas pelo autor, durante suas pesquisas com drogas psicoativas no centro psiquiátrico do Menlo Park Veterans Hospital (Califórnia). Um breve retrato do mundo psiquiátrico nos anos 70. Nesta mesma época, o filósofo Michael Foucault iniciou um importante trabalho, “A história da loucura” é uma referencia básica para entendermos a passagem histórica do “louco” na sociedade e todo o trabalho de reforma da atenção à saúde mental. Na leitura dessa obra, comprova-se que o louco nem sempre significou um desvio da natureza do homem e tampouco foi sempre excluído. Focault nos lembra que em outras épocas o louco já foi profeta, sábio e pessoa de ligação estreita com deuses.
Há quem diga que a primeira citação do louco como portador de uma doença, ou desvio, tenha sido do pensador mecanicista René Descartes, que viveu de 1596 a 1650, e afirmou ser a loucura “vapores da vesícula biliática, que tomavam conta do cérebro e o desregulava, enlouquecendo o seu portador”. Bem, crendices e descriminações não faltaram a historia da loucura, e o filme “Um estranho no ninho”, retrata o louco como a época o via, um doente perigoso e violento, que deveria ser reprimido por uma institucionalização opressora e remédios dopantes.
A intolerância sádica da sociedade psiquiátrica diante da loucura é muito bem representada pela cruel Mildred Ratched, a enfermeira chefe. Suas terapias em grupo retratam bem, a dificuldade dos profissionais da época, em considerar coerente a racionalização e o dialogo com os portadores de sofrimento psíquico, como uma forma de tratamento eficiente, prova disto é o calculismo da personagem diante do insucesso de suas terapias.
Randle Patrick McMurphy parece ser o único insatisfeito com o tratamento dado aos seus amigos, confrontando a autoridade da clinica, ele emprega novas formas de socialização entre os pacientes, trazendo a humanização para dentro do hospital psiquiátrico, o que não é bem recebido, conseqüentemente, mais tarde os médicos gerenciadores do asilo o considera “perigoso”. Analisando novamente a história da loucura, notamos que assim também foi vista a reforma psiquiátrica, até hoje vigente, porém em construção, como algo incoerente e perigoso.
As indicações ao Oscar recebidas pelo filme, não foram desmerecidas, pois seu contexto, muito bem desenvolvido pelos atores, aproxima-se bem da realidade nada agradável das casas de internação psiquiátrica nos anos 70. Historicamente autores da reforma psiquiátrica foram considerados “baderneiros” como Mac, ao denunciarem o rompimento com os direitos humanos construído no âmbito do saber psiquiátrico. Assim como fizeram ao protagonista, retardaram também o quanto puderam a humanização do tratamento dos loucos. Hoje pouca coisa mudou, ainda parece difícil reconhecer a minoria psíquica, como composta por humanos.
Logo, o louco é até certo ponto incompatível com o funcionamento estabelecido da nossa sociedade, assim como a nossa sociedade é incompatível com o louco. A sociedade produz o louco na medida em que não possui lugar para ele, daí a exclusão. Pinel, Focault, Descartes e muitos outros pensadores de renome, deixaram registrada a cronologia das evoluções e involuções do tratamento manicomial. Contribuir com a concretização do conceito moderno da loucura, com a idealizada Reforma Psiquiátrica é a maneira mais viável hoje de humanizar o asilo psiquiátrico.

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